sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Sinta o nível subindo

Eu quero morrer! Por aqueles que nem sabem da minha existência; por aqueles que sofrem sem entender a razão; por aqueles que choram sem ver o amanhã;

Eu quero chorar! Por aqueles que já não têm mais lágrimas pra derramar; pelos cubanos; pelos soviéticos que já partiram;

Eu quero gritar! Por aqueles que já estão roucos e sem forças; para aqueles que estão roucos de risos e prazeres;

Eu quero amar! Porque ninguém é Deus, e Deus é ninguém!;

Eu quero sorrir! De ironia, para aqueles que sucumbirão frente à verdade; De alegria, para aqueles que finalmente verão a luz do sol;

Eu quero viver! A vida prometida pelos nossos sonhos; a derrota daqueles que se opõem à verdade;

Eu quero morrer rindo! Para os que me sucederão; dos que não acreditaram!

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Espelho

Andei pensando...

O bem e o mal, o certo e o errado, o decente e o indecente, o moral e o imoral; todos esses conceitos nada mais são do que "anti-corpos" artificiais criados por nós : reflexos da reações sentimentais/emocionais que determinadas ações nos causam.

Explico : o certo é certo porque nos faz bem; o errado é errado porque nos faz mal. Não são o que são por serem conceitos universais plenos em sua essência, mas sim por serem dependendes das reações humanas.

Se o ato de cortar um braço fosse extremamente prazeroso, esse ato seria considerado normal - e mais, talvez, devendo-se à proporção do prazer causado, um ato de homenagem a alguém; e, por outro lado, se abraçar fosse doloroso ou mesmo considerado uma enorme ofensa, certamente seria algo errado.

Esse pensamento talvez exima todo o "mal" dos considerados maus, pois, se para eles nada de ruim é causado pela dor, não entendem como errado atos brutais que vemos por aí.

Da mesma forma, os "bons" não devem ser vistos como virtuosos, pois seguem apenas sua ética própria : ver um animal ou alguém sofrendo lhes incomoda, e é por isso que prestam-se ao socorro, à luta pelo "bem estar" de todos. Ora, se toda a pobreza não incomodasse os socialistas, eles seriam capitalistas. Se a dor dos animais não incomodasse os vegetarianos, eles seriam onívoros. Ora, é tudo baseado no sentimento pessoal.

Definimos os conceitos do mundo baseados em nós mesmos. O ego humano é o centro da Terra.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Circuito Brasileiro

Estágio um : Origem.
Ignorância, despreocupação, erro. Eleição, presidência. Incompetência, descaso. Desigualdade, miséria, abandono, carência.
Estágio dois : Solidão.
Carência, desamparo, ignorância. Ausência, tristeza, dor, vazio.
Estágio três : Fome.
Vazio, necessidade, angústia, dor, desespero.
Estágio quatro : Violência.
Desespero, fome, solidão, revolta, revólver, assalto, tiros, morte. Pôr-do-sol, nascer-do-sol. Desespero, fome, solidão, revolta, revólver, assalto, tiros, morte. Dias, meses. Desespero, fome, solidão, revolta, revólver, assalto, tiros, morte.
Estágio cinco : Ciclo.
Mortes, violência, fome. Reeleição. Ignorância, descaso. Erro, arrependimento. Incompetência, desigualdade, miséria. Solidão, fome, violência, críticas, violência, fome, campanhas, violência, fome, solidão. Descaso, fome. Mortes. Descaso.


Circuito Brasileiro II

- Em quem você vai votar? - Também não sei, acho que no João, ele é mais bonitinho. - O João ganhou. - O João disse que a situação está sob controle e que vai erradicar a fome até 2010.
- Aí, tio, tem um trocado? - E aí, tia, vai uma balinha? - Mãe, tô com fome. - Mãe, minha barriga ta doendo.... - Mãe.....mãe?
- Aí, dotô, tem um trocado? - Então me dá aí a carteira! - Aí, num foge não! (tiros) (correria)
- Ô mocinha, passa a grana aê! - Aí, me vê uma cachaça aí. - Desce mais uma!
- O Jornal disse que hoje doze pessoas morreram em assaltos e três foram sequestradas.
- Hmm....e o que tem pro jantar?

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Óbvio Ópio

''Se o óbvio ópio oblitera-nos a cada dia mais
Isso não é viver em paz?
Ou será
Que a bem da verdade
O máximo que desejará
É ver o tempo fugir
Levando glórias e vitórias
Que nos remeteriam
Ao verdadeiro sentido
Mas que nunca voltarão.
Será que tudo isso é em vão?

A tristeza cresce no vazio
Ecoando nos cantos
Escuros e frios
Tenho medo de morrer sozinho...

Se olhares nos transpassam a cada dia mais
Não vão mudar jamais?
Ou talvez
Sejam todos olhos cegos
Ou bonecos
Ou o errado sou eu?
Será que você me esqueceu...?"

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Eterna companheira

"Cada dia após tua partida
foi tortura, mas leve e sutil:
tornei-me alvo de vãs investidas
as quais recusei com pudor viril!

Hipócrita seria se não as negasse,
esquecendo juras eternas que proclamei
e perdendo-me em insubstituível impasse
cedendo às vontades que tanto abominei.

Então, Destino, dê-me tua mão!
Áspera, dura, leve, macia, fria!
Chamá-la-ei pelo teu nome, ó Solidão!

Serás companheira, serás alegria!
Pois depois dela, única paixão,
nenhuma outra mão eu desejaria!"

A Serenata do Lírio Partido

"Se acaso ouvires som agudo
que arranha até o pé do ouvido,
segures o ímpeto do choro mudo.
Tristeza infantil, choro sentido!

Nesse momento terá morrido
mais um coração desnudo
acompanhando lírio partido
ao som de mais um dueto surdo.

Aí então, terás voado;
por almas tristes serás seguido;
por brisa triste serás levado.

E eternamente serás guiado.
Na serenata do lírito partido
dançarás pra sempre esquecido."

domingo, 10 de maio de 2009

Cores que berram

- Bom, temos esse aqui. Veja só que graça, é o mais vendido entre os surfistas.

Ia aproximando o par de tênis mais e mais da cara do bigodudo.

- Não, não. Acho que ele não vai gostar.

- E esse aqui? -Disse o vendedor pegando outra caixa. - Esse é marrom com cinza, combina com as montanhas, é bom pra escalar, tem um ótimo sistema de amortecimento...

- Creio que o senhor não entendeu. O moleque é vidrado em futebol. Não tem chuteira de campo?

- Ah, sim. Claro, um momento que vou buscar no estoque.

O vendedor saiu e deixou o cliente sentado. Este tinha olhos pequeninos e bem pretos, que combinavam com seus bigodes pretos. Era dotado de uma barriga avantajada, fruto de várias tardes de domingo de futebol e choppinho. A calvície chegava pelas laterais de sua cabeça. Viera comprar um presente para o sobrinho Juca, seu preferido. Esperava sentado.

O rapaz que desde o início tentava empurrar o que havia de mais caro para o bigodudo, procurava agora sua melhor chuteira, a qual conseqüentemente esvaziaria mais o bolso da calça jeans apertada na cintura que estufava ainda mais a barriga do cliente bigodudo. Quando já pensava ter se esgotado aquele modelo, encontrou, debaixo de uma coluna de tênis femininos, a caixa. A última caixa, aliás. Abriu-a para ver se estava tudo certo, e espantou-se ao deparar-se com uma chuteira laranja e verde. Laranja e verde! Quem diabos iria comprá-la? De que servia uma chuteira que não fosse preta, ou prateada, como estava agora na última moda entre os jogadores considerados "medalhões"? Ninguém compraria aquela chuteira. Não era à toa que estava ali, escondida, esquecida. Laranja e verde! Contudo, pensando nos lucros e em formas de ludibriar o carrancudo bigodudo, decidiu levá-la e mostrá-la ao cliente.

- O senhor deu sorte! Este aqui é o último par. A melhor chuteira, da melhor marca.

O homem pegou a caixa e abriu-a.

- Laranja e verde? Parece mais com um uniforme de escola de samba!

- Ora! Mas o seu filho é vidrado em futebol, ou em moda? Com essa aqui ele vai bater faltas espetaculares, correr sem derrapar e aumentar o domínio de bola!

O vendedor falava como se estivesse num comercial pra tevê e já tivesse treinado essa mesma fala mais de tantas vezes.

- Não é meu filho...É meu sobrinho. Não tive filhos....Bom, vou ficar com ela.

Pagou caro pelo presente colorido e saiu da loja cantarolando.

- Sistema de amortecimento....pff...!

E riu.

No dia do aniversário de Juca, o tio Roberto fora o primeiro a chegar. Sorridente, abraçou o menino (não tão entusiasmado quanto o tio) e lhe entregou o presente. Juca abriu o pacote e lá estavam as chuteiras: laranja e verde. Forçou um sorriso e deixou a caixa na mesa. Agradeceu ao tio e foi para a cozinha. Era um garoto bem educado.

A mãe, que enrolava brigadeiros, olhou-o de cara feia, e disse carrancuda :

- Juca! Tente ser mais entusiasmado! Seu tio Roberto pagou caro pelos sapatos!

- Não são sapatos, mãe. São chuteiras. Você sabe que detesto futebol. E ainda por cima laranja e verde.

- Ora, não importa! Vista já esses tênis e vá mostrar pro seu tio!

Juca, na verdade, era um garoto que preferia ficar em casa a sair de noite; de ler um bom livro, a praticar esportes. Por conseqüência de tais hábitos, escrevia sempre poemas muito bons, reconhecidos pela sua professora como um jovem talento. Tinha compaixão pelo tio, conhecendo sua história. Roberto, palmeirense fanático, casara-se cedo e era completamente apaixonado por sua esposa. Ela estava grávida. Na hora do parto, Deus quis levar sua alma e a da criança que trazia no ventre. Nunca mais Roberto olhou para outra mulher. Via em Juca o filho que não teve, e, por amar o futebol, preferia acreditar que Juca também o amava. E essa compaixão que o menino tinha pelo tio foi que o fez subir ao seu quarto e vestir as chuteiras. Laranja e verde. Antes de descer, olhou para a prateleira e viu o presente que ganhara de manhã de seus pais. Um livro de poemas, comprado no sebo da esquina, por cinco reais. E desceu, com a cara mais contente do mundo, parte pelo livro, parte para contentar o tio.

- Isso! Olha só que campeão! Uma beleza! O futuro Edmundo! As cores são berrantes, mas dá pra jogar uma bola..!

Juca sorriu sem dizer nada. Só pensava no que iria fazer quando todos os convidados já tivessem ido embora. Iria à casa da namorada, que também amava a leitura, para ler e escrever com ela.

À noite, quando só sobraram na casa Juca e sua mãe, esta foi ter com aquele.

- Eu sei que você não gosta muito de bola, mas precisa entender seu tio. Não pôde ter filhos, e têm você como sendo dele. E adora futebol, e gostaria que você gostasse também. Diz pra todos os amigos que você é palmeirense roxo! Vive te levando nos estádios...

Sorrindo, e com um fantástico brilho de compreensão nos olhos, que só as crianças quando têm compaixão podem ter, ele responde um simples "É mãe, eu sei.", e saiu pela porta, em direção à casa da namorada, Marina.

Saiu com o livro embaixo do braço, e os tênis laranja e verde nos pés. Marina morava longe, uma meia hora de caminhada. Quando chegou lá, cansado, mas feliz, teve de explicar à mocinha que ria dele o porquê de usar aquela chuteira. "Laranja e verde!" dizia a menina.

Leram, namoraram, escreveram, trocaram juras de amor, e , antes de Juca sair, Marina escreveu uma dedicatória e um poema feito por ela na capa do livro ganho de aniversário e se despediu dele com um beijo demorado. No meio do caminho de volta, lá pelas onze, saltou da penumbra da noite um homem envolto de sombra. Mal encarado, se tornava ainda mais assustador àquela hora. Juca andou depressa. O homem andou mais :

- Passa a grana moleque! -Disse, encostando algo pontiagudo nas costas do menino.

- Mas eu não tenho nada...-Calmamente, escondendo o medo, Juca respondeu ao marginal.

- Então passa esse livro aê! -Forçou o canivete contra o ombro do garoto, que encolheu-se mais ainda.

- Não! O livro não, por favor! -Agarrou-se a ele como um bebê agarra-se à mãe numa situação de perigo.

- Ah, moleque. Entenda minha situação...preciso levar alguma coisa.

O menino, suando, não pestanejou. Tirou o par de chuteiras dos pés, e antes de entregá-las nas mãos do bandido, falou:

- Toma. As cores são berrantes, mas dá pra jogar uma bola.

sábado, 9 de maio de 2009

Texto Teatral - A Morte

Ah, a Morte!
O fim de tudo, le grand' finale!
O fechar de cortinas da grande comédia!
O esperado descanso da caminhada longa e dura!
A desejada trégua dos valentes guerreiros que lutaram contra a Injustiça e até mesmo contra a própria Morte!
O último e longo gole de uma taça de um doce vinho!
Ah! Como é tocante o último suspiro de vida de um ser condenado, com destino traçado até as trevas!
Sim! Ninguém escapa! Até o filho do Altíssimo caiu diante das implacáveis asas negras do Anjo do Fim!
O Apocalipse! Genocídios, matanças, sofrimento! Motivos e causas da morte, a Morte que nos livra da dor!
Teu assassino será teu carrasco ou teu salvador?
Vá! Doce capuz negro noturno! Livre-o da dor, do sofrimento, das preocupações!
Livre-o dessas chagas com teu belo machado! Machado manchado do líquido vermelho que nos anima : o vinho!